A Polícia Federal (PF) intensificou as investigações sobre o esquema bilionário de descontos indevidos no INSS e aponta o ex-ministro da Previdência do governo Bolsonaro, José Carlos Oliveira, como um dos pilares institucionais da fraude. Ele e seu sócio, Edson Akio Yamada, são tratados como figuras centrais de uma engrenagem que operou entre 2019 e 2024 e pode ter causado prejuízo superior a R$ 6 bilhões a aposentados.
Os dois foram alvos de busca e apreensão na nova fase da Operação Sem Desconto. Oliveira, que já presidiu o INSS antes de assumir o ministério, teve o uso de tornozeleira eletrônica autorizado pelo ministro André Mendonça, do STF.
Na decisão, o ministro citou o relatório da PF que afirma que “José Carlos ocupou os mais altos cargos da administração pública em matéria previdenciária no Brasil, o que permitiu à organização criminosa manter e expandir o esquema”. Ao todo, foram autorizadas 10 prisões e 63 mandados de busca e apreensão na última quinta-feira (13).
Acesso privilegiado e repasses
Para a PF, Oliveira atuou diretamente para favorecer a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), entidade que desviou mais de R$ 640 milhões do INSS. Em 2021, quando chefiava a diretoria de Benefícios, ele liberou R$ 15,3 milhões à associação sem a apresentação dos documentos de filiação exigidos no acordo de cooperação. A decisão permitiu que a Conafer aplicasse descontos indevidos em mais de 650 mil benefícios.
Acordos com outras 10 associações investigadas no esquema podem chegar a mais de R$ 1,9 bilhão em descontos indevidos, segundo apuração do site Metrópoles.
Os investigadores localizaram planilhas do chamado “núcleo financeiro” da entidade e identificaram pagamentos associados a codinomes. Em fevereiro de 2023, um repasse de R$ 100 mil aparece vinculado a “São Paulo Yasser”, apelido atribuído a Oliveira, que mudou de nome para Ahmed Mohamad após converter-se ao islamismo.
De acordo com a investigação, após esse pagamento, Oliveira enviou uma mensagem de agradecimento por WhatsApp a Cícero Marcelino de Souza Santos, apontado como operador financeiro da Conafer. Para os investigadores, o gesto reforça a suspeita de recebimento de valores indevidos em troca de atuação para evitar a suspensão do acordo que permitia à entidade seguir aplicando descontos.
Yamada também manteve decisões favoráveis às associações investigadas mesmo após a saída de Oliveira do ministério. Fora do serviço público, os dois são sócios da consultoria Oriente, que inclui a filha do ex-ministro no quadro societário. Yamada ainda doou R$ 15 mil à campanha do ex-ministro para vereador de São Paulo, em 2024.
Blindagem
Mesmo no centro das investigações, Oliveira foi aposentado pelo INSS na semana passada. A decisão gerou desconfiança entre servidores, que enxergam na medida uma possível tentativa de blindagem contra um Processo Administrativo Disciplinar que tramitava na Controladoria-Geral da União. O INSS afirma que não foi comunicado previamente.
Com mais de 40 anos de carreira, Oliveira acumulou poderes dentro da Previdência, passando por cargos de gerente-executivo, superintendente, diretor, presidente do INSS e, por fim, ministro. Agora, sua trajetória é reavaliada pela Polícia Federal, que identifica indícios de uso da estrutura pública para sustentar uma rede de fraudes em larga escala.
Quem foi preso preventivamente pela operação “Sem Desconto” na quinta-feira (13)
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Alessandro Stefanutto, ex-presidente do INSS
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Antônio Carlos Antunes Camilo, o “Careca do INSS”
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André Paulo Felix Fidelis, ex-diretor de Benefícios do INSS
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Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, ex-procurador-geral do INSS
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Thaisa Hoffmann, empresária e esposa de Virgílio
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Vinícius Ramos da Cruz, presidente do Instituto Terra e Trabalho (ITT)
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Tiago Abraão Ferreira Lopes, diretor da Conafer
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Cícero Marcelino de Souza Santos, operador financeiro da Conafer
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Samuel Chrisostomo do Bonfim Júnior, também vinculado à Conafer